Vivemos um tempo em que o diálogo entre gerações parece cada vez mais raro e, por vezes, tenso. É comum ouvirmos pais e educadores dizerem: Essa geração está perdida. Mas talvez o que tenhamos diante dos olhos não seja apenas uma geração desorientada, mas sim uma geração que jamais foi verdadeiramente encontrada, no sentido afetivo, simbólico e relacional do termo.
A geração Z, formada por adolescentes e jovens adultos que cresceram na era digital, vive hoje uma crise de sentido e pertencimento. E essa crise, ao contrário do que muitos pensam, não começou com eles.
O que aconteceu com os laços?
A construção dos vínculos afetivos sempre foi desafiadora, mas tornou-se ainda mais complexa na contemporaneidade. Em meio a transformações rápidas, instabilidade familiar, aceleração tecnológica e discursos fragmentados sobre autoridade, muitas crianças e adolescentes cresceram sem adultos verdadeiramente disponíveis emocionalmente para sustentá-los.
A geração anterior, muitas vezes criada sob modelos rígidos e até violentos, tentou oferecer aos filhos um mundo com mais liberdade mas, com frequência, confundiu liberdade com ausência de limites, e acolhimento com concessão.
O resultado disso foi uma infância com menos frustrações, mas também com menos presença estruturante, menos Supereu, menos simbolizações. O medo de frustrar os filhos levou muitos pais a evitarem o conflito e, sem castração simbólica, o eu da criança não encontrou contorno, o desejo não encontrou direção, e o sofrimento não encontrou escuta.

Uma geração hiperconectada e desconectada.
A geração Z cresceu com telas nas mãos, mas sem mãos afetivas que a segurassem emocionalmente. Está conectada 24 horas por dia a múltiplas informações, mas muitas vezes desconectada de si mesma.
Vivem o paradoxo do tempo psíquico congelado: querem tudo ao mesmo tempo agora, mas não conseguem sustentar a frustração do “ainda não”.
A consequência é um número crescente de jovens ansiosos, deprimidos, esgotados, tentando responder à exigência de performar em um mundo que não oferece sustentação emocional real.
Adolescentes perdidos… ou órfãos de simbolização?
A pergunta que fica é: será que essa geração está perdida por fraqueza sua, ou por heranças mal elaboradas das gerações anteriores?
Na visão da psicanálise, nenhuma geração nasce problemática. O que existe são histórias mal simbolizadas, afetos não nomeados, funções parentais enfraquecidas.
Quando falamos em função paterna, estamos falando daquilo que organiza, limita, aponta um caminho, e não necessariamente da figura do pai biológico.
Faltou, e ainda falta, função simbólica, escuta estruturante e continência emocional. Isso não é sobre culpa, mas sobre responsabilidade geracional.
Laços que curam ainda são possíveis.
O desafio agora não é apenas diagnosticar o desencontro entre as gerações, mas construir espaços de reconexão, de escuta, de reabilitação simbólica desses laços.
A psicanálise tem muito a oferecer nesse processo. Ela nos ajuda a compreender que o sofrimento psíquico dos jovens é muitas vezes o eco de um silêncio anterior, o silêncio da falta de escuta na infância, da ausência de referência, da quebra da função simbólica.
Talvez os adolescentes de hoje não estejam perdidos. Talvez estejam apenas esperando que, finalmente, alguém os encontre verdadeiramente.
As opiniões expressas nesta matéria são de responsabilidade do autor e não refletem, necessariamente, a posição deste veículo de comunicação.
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Sobre a Autora: Léia Nametala 📚
Léia Nametala é pedagoga, psicanalista, especialista em psicanálise infantil e doutoranda na Miesperanza University. Formada em Psicanálise pelo Instituto Bittencourt, também possui pós-graduação em Psicanálise.
Atua com atendimentos psicanalíticos, mentorias e integra o Clube do Livro Miesperanza. Além disso, escreve mensalmente para o Jornal Filosofar, abordando temas da psicanálise.
Instagram: @leianametala_psi